É o que afirma o presidente da Intercom, pesquisador e professor, Antonio Hohlfeldt. O Nexjor conversou com ele sobre a pós-modernidade e o jornalismo
O tempo muda muita coisa, mas não muda tudo. Mesmo com a evolução praticamente diária das tecnologias, certos ofícios, como o jornalismo, continuam fiéis ao seu propósito inicial e sua essência. É isso que Antonio Hohlfeldt defende. Professor, pesquisador e atual presidente da Intercom, ele participou no dia 21 de março da aula magna da Faculdade de Artes e Comunicação (FAC) da Universidade de Passo Fundo (UPF) palestrando sobre a pós-modernidade e sua aparência de liberdade.
O tema surgiu de algumas perspectivas da evolução da humanidade sobre a condição pós-moderna, especialmente sobre a questão da tecnologia. “Evidentemente que a tecnologia é importante, ela nasce de criatividades e potenciais, você tem que inventar coisas que ainda não existem. Mas, ao mesmo tempo, o excesso de tecnologia que está nos rodeando tira a criatividade e o imaginário”, disse Hohlfeldt. Ele ainda ressalta que nós nos acostumamos a encarar as coisas com naturalidade. “Não temos mais estranhamentos, não temos mais dúvidas, não temos mais medos. Vamos aceitando tudo com naturalidade, a gente não se espanta mais com as coisas, e eu acho isso muito ruim. Não nos damos conta de que essa tecnologia resulta de um imaginário”, finalizou.
E essas mudanças e evoluções teriam alterado o processo e os aspectos jornalísticos como um todo? Para Hohlfeldt, não. “O jornalismo continua sendo fundamentalmente a narrativa de um acontecimento que provoca curiosidade nas pessoas na medida em que elas não conheçam esse acontecimento”. O que se tem é mais rapidez, já que as notícias chegam a maior velocidade e quantidade obrigando ao jornalista um trabalho mais pesado de seleção, mais perigo e maior responsabilidade.
Novos modos de seleção
Para ilustrar esse cenário, ele relembra dos tempos em que trabalhava na Rádio Canadá Internacional (RCI) na década de 70. “Todo dia, às sete da manhã, a gente descia para a sala do telex, tecnologia mais moderna da época. Uma sala enorme com dezenas de máquinas e com aquele papel todo no chão, porque tinha gravado todas as notícias vindas de todas as agências imagináveis. Seria impossível ler aquilo tudo para selecionar dez notícias que iriam ao boletim às sete da noite. Então, eu criava dois ou três critérios externos, dando preferência para agências mais críticas à ditadura. Com isso furava a censura que tinha dentro do país”. Embora fosse um critério pessoal que pendia mais para o lado político, Hohlfeldt explica que ainda era um critério jornalístico, já que várias pessoas não tinham as informações veiculadas em seu programa nas emissoras do Brasil.
Essa hierarquização da seleção permanece com a internet. “O que aparece primeiro quando você entra em um servidor? As matérias mais procuradas. Como são as mais procuradas, elas ficam na frente. Como elas ficam na frente, são mais procuradas. Quem é que entra na página dez no site tal para ver as notícias? Ninguém vai, a não ser que esteja fazendo uma pesquisa muito mais aprofundada”, argumenta Hohlfeldt, com o porém de que pode haver algumas manipulações perigosas, exemplificando com ações usadas nas áreas da publicidade e marketing. “Na hora de lançar um produto ou um candidato, por exemplo, eles já têm um grupo organizado que entra ao mesmo tempo para realizar a pesquisa quando um site ou notícia vai ao ar, colocando ela no topo. Uma vez lá, ela automaticamente gera mais pesquisa e mais topo. Isso é uma falsidade e quem não conhecer o jogo da internet vai embarcar, ficando nos primeiros, como a gente lá atrás com o telex”, finaliza.
[stextbox id=”custom” caption=”PESQUISA” float=”true” align=”left” width=”320″]Ouça abaixo o depoimento de Hohlfeldt sobre a pesquisa científica em jornalismo no país. [mp3j track=”www.upf.br/nexjor/wp-content/uploads/2013/03/Depoimento-Hohlfeldt.mp3″][/stextbox]Um reflexo dessa grande quantidade de informação é que, ao invés de informar, ela acaba perturbando. “Hoje, quem conhece os últimos cinco minutos? Essa quantidade de informação é mais desinformação, e o que parece ser uma liberdade aparenta uma prisão”, salienta Hohlfeldt, lembrando que, no jornalismo, o que temos são quantidades, abrangência e rapidez diferentes, mas que o processo em si continua igual. “O jornalismo não mudou, sua essência é exatamente a mesma”.