Especial Trânsito: Os reflexos da relação entre os veículos e os buracos

Para transitar nas ruas de Passo Fundo, o motorista precisa preparar a sua paciência e, principalmente, o seu bolso

Congestionamentos, atrasos, vias públicas em péssimas condições de circulação e motoristas impacientes. Infelizmente, essa é a realidade do trânsito passo-fundense, que, nas últimas semanas, ganhou as manchetes dos jornais da região e uma grande mobilização nas redes sociais. A polêmica criada em torno das declarações do vereador Roque Letti sobre os adesivos que levavam a inscrição “Passo Fundo, capital dos buracos” não é para menos. As ruas da cidade, incluindo trechos da principal avenida e o trevo de acesso à Universidade – local por onde transitam diariamente milhares de acadêmicos -, estão mal conservadas; em parte, devido às obras que estão sendo realizadas no local para instalação da rede de esgoto e duplicação da BR 285.

Apesar de pertinente, esse assunto fica para a próxima reportagem. Dessa vez, a nossa equipe procurou entender sobre um dos lados que mais sente as más condições das vias: o carro. Tiago Oliveira, mecânico da Car House Toyota, explica que uma das partes mais afetadas no carro é a suspensão: “Na parte de suspensão, o veículo é constituído por peças como a barra estabilizadora, bieleta, amortecedor, mola, bandeja e coluna de direção. No momento em que uma dessas peças for danificada, pode comprometer qualquer outra parte da suspensão. Por isso, elas precisam ser trocadas periodicamente. No caso de passar por um buraco, lugares de grande inclinação ou uma batida, a geometria do carro também é prejudicada”.

Outra peça que também sente todo esse sobe e desce é o amortecedor. Se ele sofrer uma pancada muito forte, pode ser deslocado, além da possibilidade de ocasionar vazamentos. Existe também a chance de entortar a barra, que faz com que o veículo perca a geometria e a estabilidade, o que pode, na pior das hipóteses, ocasionar um acidente grave. Tudo, é claro, depende da gravidade do estrago e do tamanho do buraco. “No caso, quando passa em um buraco, o carro sobe e desce de maneira muito forte, mexendo com o montante. Esse subir e descer, conforme a gravidade da pancada, pode estourar tudo, incluindo a parte de bandeja, suspensão, pivô, mola, etc”, explica Tiago.

Uma via esburacada exige redução de velocidade e é aí que entra a parte dos freios. Se o condutor precisar acionar o freio constantemente – por causa de buracos -, terá um desgaste precoce de pastilha, de disco e de êmbolo, exigindo que a manutenção seja mais frequente. Esse problema ocorre, principalmente, em carros automáticos, que possuem um sistema de frenagem bem mais sensível – três vezes mais sensível que um carro manual.  Além disso, o sistema de semieixo – ligação da suspensão com o motor – também pode ser afetado. De acordo com Tiago, passar por um buraco pode prejudicar toda a parte de suspensão do carro, direta ou indiretamente, inclusive danificar o cárter – parte reserva do óleo que fica na parte de baixo do carro. “No momento em que você aciona o carro, ele tem um pescador, que vai sugar todo o óleo que está embaixo e fazer um ciclo, subindo e descendo no motor. Se chegar a furar o cárter, vazar o óleo e você continuar andando sem perceber que está furado, você vai perder o motor, porque o motor não vai ter lubrificação e vai estar furado”. No caso dos carros automáticos, além do cárter do óleo de motor, existe o cárter da caixa, que, caso seja furado e não seja diagnosticado logo, implicará a perda da caixa.

Gastos com o conserto dos veículos

Para infelicidade do bolso, essas peças não podem ser consertadas. Pastilha, disco e semieixo: tudo precisa ser trocado. Existe um reparo feito em tornearia, chamado retifica de disco, mas que não é aconselhável, justamente por ser uma parte muito importante para a suspensão do veículo. É claro que tudo depende da velocidade do veículo e do tamanho do buraco, o que varia bastante. Mas, tudo que for próximo do chão corre o risco de bater, como a barra da direção, por exemplo. Em muitos casos, a única maneira de perceber que uma peça está estragada é com a desmontagem: o que já demanda mão de obra e peças. Em outras palavras, mais gastos.

Quanto aos valores para troca das peças, eles variam conforme o modelo do carro. Citando como exemplo um Corolla, na parte da suspensão, a troca do amortecedor custaria 375 reais, fora a mão de obra, que, em média, custa 60 reais. O disco só é vendido em pares, e um jogo de discos custa 720 reais. Se o disco for trocado, é necessária a troca da pastilha de freio, que custa, em média, 300 reais. Já a troca da bieleta traria um gasto de cerca de 150 reais. Isso sem falar nas calotas, que podem ser perdidas ao passar por um buraco e, em um Corolla, custa 80 reais cada uma.  Em síntese, por cima, um buraco pode causar um prejuízo de mil reais.

Aumento no número de carros com problema de suspensão

Segundo Tiago, o número de veículos com problemas devido às vias esburacadas tem aumentado. “Percebemos um aumento na busca por reparos na suspensão dos veículos. Com certeza, é isso que causa mais problema. Só na última semana, para trabalhar na suspensão, chegaram mais de 30 carros aqui na concessionária. Oitenta por cento do fluxo de veículos com os quais nós trabalhamos chegam apresentando esse tipo de problema”, explica.

Além de ter que lidar com os atrasos provocados pelos desvios necessários para a realização de obras, o condutor precisa preparar o bolso. Geralmente, a suspensão é a parte mais cara do veículo e, também, a mais afetada ao trafegar por ruas esburacadas. Se Passo Fundo é mesmo capital dos buracos – algo que já vem sendo contestado por outras cidades -, só o tempo dirá. No entanto, uma coisa é certa: quem se atreve a dirigir nessa cidade precisa, indiscutivelmente, de uma carga extra de paciência.

Veja como são algumas das peças citadas na reportagem:

Disco do freio

Bandeja inferior

Cárter da caixa automática

Cárter do óleo de motor

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