Guerras biológicas sempre deram pano pra manga na indústria cinematográfica. Eu, Robo (Alex Proyas), Resident Evil (Paul W.S. Anderson), Matrix (Andy e Lana Wachowshi), Extermínio (Danny Boyle): há tempos que roteiros que projetam uma humanidade transformada ou mesmo que transformam a humanidade, rendem grandes bilheterias para os cinemas. Muitos clássicos das telinhas vieram das folhas, como O Poderoso Chefão, do romance homônimo de Mario Puzo, Um corpo que cai, da dupla de escritores Pierre Boileau e Thomas Narcejac, Laranja Mecânica, de Anthony Burgess, assim como toda a saga Harry Potter, da escritora britânica J.K. Rowling. Não foi diferente nas 368 páginas que se tornaram os 116 minutos do filme Guerra Mundial Z. Claro que isso não significa que esse venha a ser um clássico.

O livro homônimo do norte-americano Max Brooks invade a American way of life por depoimentos colhidos por Gerry Lane, funcionário da ONU que atravessa o mundo numa corrida contra o tempo para impedir uma pandemia que está ameaçando dizimar a humanidade inteira. Com seu tom científico, frio como corpos que morreram, caracteriza as formas de como sobreviver diante uma pandemia que está desafiando exércitos e governos. A literatura serve como um manual para conduzir as famílias a sobreviverem diante dos acontecimentos que marcam a era Bush, período de um governo hegemônico que batalha para ditar ao mundo o seu viés de conduta. O cotidiano é também o que credita o início do filme de Marc Forster, ao apresentar nas primeiras cenas uma típica família norte americana que come panqueca no café da manhã e enfrenta engarrafamento no trânsito metropolitano ao levar os filhos para a escola – nem precisamos falar da Pepsi em determinado momento do filme. Em sua introdução, traz memórias que resgatam a natureza de uma humanidade que, por vezes escondendo doenças nas frestas da história, despertam patologias ao som de gritos e gemidos de mortos vivos. Mal desconfiamos ao ver o filme que o antibiótico que poderá auxiliar na preservação da humanidade nessa “guerra biológica”, encontra-se no próprio cerne da questão: o benefício de ser doente. Sigamos apenas no filme.
Epidemias globais sempre estiveram presentes na história do cinema – desde os anos 20 – que como arte, não só imita, mas cria realidades. Com o primário na classe zumbiresco, The Bad (1920), inaugura-se uma nova maneira de fazer arte nos palcos e nas salas de cinema, como uma válvula de escape que libera as angústias reprimidas das guerras e seus resultados em formas de humanos transformados – zumbis. Em diálogo com os primórdios dos zumbis de Hollywood, Guerra Mundial Z – mesmo que com suas contradições de filmagens e roteiro devido às brigas entre elenco e produção – inova na temática que traz os mortos à vida. Já não são zumbis sedentários que caminham lentamente. A produção herda a audição apurada por parte dos zumbis dos demais filmes – teria o compositor da trilha do filme, Marco Beltrami, parte nisso? – mas caracteriza a nova casta, já antiga no cenário hollywoodiano, como ágeis e ativos na colonização de sua espécie, lembrando então Extermínio e Morada dos Mortos que trazem zumbis ágeis. Provavelmente, se fosse o caso de você ser mordido quando iniciou a ler essa resenha, já integraria a massa que faz o governo Norte Americano e a Organização das Nações Unidades, no filme, perderem o controle da situação por não saberem como posicionar-se diante de uma pandemia desconhecida. (Qualquer semelhança com a atualidade política brasileira é mera coincidência). Esse descontrole é a tensão que embasa toda a história do filme, que procura descobrir as origens e as curas para o mal que oprime a todos. A guerra biológica se instaura como processo de opressão, rememorando os primeiros anos da América aos olhos da Europa – o detalhe é que a opressão inverteu seus sujeitos. A sétima arte nos permite essa inversão de papéis.

A nova guerra mundial traz a temática de “onde ocorreu” o surgimento de espécies como o clímax da narrativa. Não respondendo à pergunta que propõe para nortear a composição narrativa do filme, Marc Forster, em sua adaptação para as telinhas, encontra no antídoto do problema de “como sobreviver”, os melhores momentos do filme. Sem saber o motivo para o aparecimento dos zumbis, uma equipe de pesquisadores vai, de país em país – a faixa de gaza, talvez por um grande acaso, está na lista de território visitado – à procura de vestígios que expliquem o que levar à transformação e a criação de uma classe não reconhecida até então. Cabe a pergunta: o enredo tem a pretensão de movimentar novamente as salas de exibições com uma possível continuação ou o “I always want more” é a proposta de Marc Forester? Ou, mesmo, nenhuma das duas?
Ah, talvez a diferença desse para os demais seja que traz Brad Pitt como estrela principal, mas isso nem é a melhor coisa do filme.
