Quando falta respeito aos mais velhos

Os olhos já não enxergam como antes. A pele, antes jovem e lisa, agora é tomada por rugas, que deixam claro que o tempo passou. Chegar à terceira idade implica em cuidados, afeto e dedicação das pessoas mais próximas. É preciso ter paciência. Porque é justamente nessa fase que trocamos, aos poucos, a independência de toda uma vida por limitações, que nos deixam mais frágeis, suscetíveis às moléstias que não tardam a chegar. Mas usar da alcunha de idoso ou contar seis décadas de vida não é o maior problema. Há outro, este sim tão perigoso quanto uma doença, que vitima um idoso a cada dez minutos no Brasil: a violência familiar.

Os dados que serão apresentados neste texto não condizem com número real de casos de violência, porque a grande parte das agressões não é comunicada às autoridades. Segundo a coordenadora do Balcão do Idoso de Passo Fundo, Denize Luz, boa parte dos idosos que sofrem agressão tem medo de prestar queixa porque encara a questão como uma derrota, uma humilhação. “A principal dificuldade é o idoso se convencer de que tem que fazer a denúncia, de que tem que levar isso a público. Porque o fato de ele estar sofrendo algum tipo de violência faz com que ele se sinta um fracassado”, afirma. Há outro componente que atrapalha a formulação da denúncia: as vítimas desconhecem como e a quem informar os maus tratos. Em Passo Fundo, os cerca de 24 mil idosos que residem na cidade têm diversos meios, como o Balcão do Idoso e o Ministério Público, que trabalham em conjunto para atender as ocorrências.

Tipos de violência

A questão financeira é uma das principais formas de violência contra idosos. Geralmente, por não necessitarem de grandes quantias para viver, e pela certeza do dinheiro da aposentadoria, eles são alvos fáceis de parentes próximos. Segundo o professor da UPF, doutor em Economia, Ginez Leopoldo Campos, oito em cada 10 idosos têm empréstimos em banco ou financeiras. “A população idosa brasileira está significativamente endividada por conta do crédito fácil via empréstimo consignado”, avalia.

Apesar de existir uma lei que limita as parcelas de empréstimos em até 30% dos vencimentos mensais do idoso, há uma forma de burlar o sistema: para que a parcela não ultrapasse o teto estabelecido, são feitos empréstimos com somas altas, para serem quitadas em muitos anos. O resultado disso é o endividamento e, por consequência, o comprometimento da condição de vida da vítima. Para o secretário de Cidadania e Assistência Social de Passo Fundo, Saul Spinelli, o problema atinge todas as classes sociais. “Já tivemos casos de pessoas com aposentadorias de 10 mil reais passando necessidades, sendo vítima dos ‘abutres’ da família. Tivemos um caso de um adulto que não sossegou até conseguir uma mesada do idoso”, recorda.

Os casos de violência contra idosos mais registrados são os relacionados aos cuidados. Em 2013, o Balcão do Idoso de Passo Fundo registrou 36 denúncias de casos como abandono, negligência ou autonegligência. Segundo dados do Disque 100, o serviço gratuito de denúncias por telefone da secretaria de Direitos Humanos (SDH) da Presidência da República, no Brasil, em 2013, mais da metade das queixas envolveram os filhos e netos.

Envelhecimento da população brasileira

A parcela de pessoas maiores de 60 anos não para de crescer no Brasil. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o número de idosos dobrou no período entre 1991 e 2011. A queda da mortalidade infantil e a diminuição da fecundidade são alguns dos fatores que indicam que, em 2060, os idosos devem representar um quarto da população brasileira. Hoje, eles representam 11% dos quase 203 milhões de habitantes. O aumento dos casos de violência contra idosos exige a atenção de todos. Segundo Denize Luz, além dos parentes mais próximos, os vizinhos também podem ajudar a identificar os casos de maus tratos. “Se um vizinho percebe que o idoso está sofrendo violência e não denuncia, ele está sendo omisso. E omissão é crime. Os vizinhos têm que fazer esse serviço de levar a denúncia”, afirma.

A violência contra o idoso, e mesmo o crescimento da população maior de 60 anos no Brasil, exige novas formas de pensar a sociedade. Uma delas é aparentemente simples: encarar o envelhecimento com qualquer outra fase da vida humana, e não como uma deficiência, um motivo para menosprezo. É bom lembrar que o tempo passa para todos, sem exceção. E se nada der errado em nossas trajetórias, seremos nós os idosos de amanhã, e não esperamos envelhecer sob a sombra do descaso de quem mais amamos.

Lugares para denunciar a violência contra o idoso em Passo Fundo

Delegacia de Polícia Rua Cesar Santos, 170 – Petrópolis 3317-1111

Posto da Mulher 3313-1111 ou 3316-6499

Promotoras Legais Populares e Comissão de Direitos Humanos Rua Senador Pinheiro, 304 3313-2305

COMUI-Conselho Municipal do Idoso Rua Teixeira Soares, 625 – Centro 3312-3070 ramal 243

Brigada Militar Av. Presidente Vargas, 1501 – São Cristóvão Fone: 190 Ministério Público Rua Bento Gonçalves, 720 – Centro 3313-1330

Defensoria Pública Rua General Neto – Centro (em frente ao Fòrum) 3312-7907

Disque denúncia Polícia Civil Rua Nascimento Vargas, 689 – Vergueiro 0800 5105320

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